
Michael Halliday e suas contribuições na Analise do Discurso
Henrique Franchi
Este artigo tem o intuito de falar sobre o linguista inglês Michael Halliday (1925 – 2018) e as suas principais contribuições para a Análise de Discurso (AD). Esta reflexão surgiu a partir de uma atividade do grupo de estudos Gepalle, (Grupo de Estudos sobre Alfabetização e Letramento da USP de Ribeirão Preto).
O linguista supramencionado não é tão conhecido como Ferdinand Saussure (1857-1913), Michael Bakhtin (1895-1975) e Noam Chomsky (nasceu em 1928), então...
Quem foi Michael Halliday?
Michael Alexander Kirkwood Halliday, ou Michael Halliday, foi um linguista que nasceu na cidade de Leeds, na Inglaterra, no dia 13 de abril de 1925, e morreu no distrito de Manly, que pertence à cidade de Sydney, na Austrália, no dia 15 de abril de 2018, aos 93 anos. Seus pais estimularam seu amor pela linguagem. A sua mãe Winifried, estudou francês e seu pai foi um dialetologista (pessoa que estuda dialetos), professor de inglês e poeta que gostava muito da gramática e do teatro Elisabetano.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Governo Britânico implantou forças militares na Ásia e estabeleceu um curso de treinamento em línguas estrangeiras do serviço nacional. Halliday se voluntariou para esse curso em 1942 e foi-lhe atribuída a Unidade de Inteligência Chinesa em Calcutá. Após a guerra, ele teve uma concessão da Universidade de Londres para estudar chinês, como aluno externo na Universidade de Pequim. Nessa universidade, ele também ensinou inglês e começou a ter algumas ideias que posteriormente se tornaram as suas teorias sobre a linguística e a gramática funcional.
Como Halliday desenvolveu suas ideias?
Suas ideias incluíam pesquisas nas línguas mandarim e sino-tibetanas (chinês, tibetano, birmanês e butanês) e na língua e dialetos do Delta do Rio das Pérolas (cantonês e outros dialetos), lideradas por Wang Li, da Universidade de Lingnan em Guangzhou. Após suas experiências na Ásia, Halliday retornou à Inglaterra para realizar um trabalho de pós-graduação na Escola de Estudos Orientais e Africanos em Londres, onde foi influenciado pelo principal linguista inglês, John Firth (1890-1960), e depois pelo sociólogo Basil Bernstein (1924-2000). As experiências chinesas de Halliday o deixaram com uma visão marxista, e o aumento das tensões da Guerra Fria e a eclosão do macartismo o tornaram inelegível para permanecer na universidade.
Então, ele fez parte do departamento chinês da Universidade de Cambridge, onde completou seu doutorado em 1955 sob a supervisão de Firth. Na Universidade de Cambridge, ele também se tornou um membro ativo do Partido Comunista e trabalhou ao lado de sábios, incluindo os historiadores eminentes Joseph Needham (1900-1995) e Eric Hobsbawm (1917-2012). Halliday se separou do partido devido à brutal invasão da União Soviética na Hungria em 1956.
Também na Universidade de Cambridge, Halliday aplicou seus conhecimentos na linguagem. Extraindo da obra de Firth, Halliday entende a linguagem como construção social e, essencialmente, o mecanismo pelo qual a sociedade é reproduzida e transformada. Essa ideia, combinada com seu compromisso de melhorar as condições sociais, o levou a procurar uma nova maneira de ensinar a linguagem para melhorar as taxas de letramento e dar às pessoas melhores chances.
Nem tudo são flores: a briga entre Halliday e Chomsky.
A abordagem de Halliday socialmente focada o colocou em desacordo com as pessoas estabelecidas do lado "natureza" do debate "natureza versus criação". Entre essas pessoas estava incluído Noam Chomsky e seus seguidores, que acreditavam que a capacidade humana para a linguagem humana era inata. Halliday argumentava que o tom do desenvolvimento da linguagem se estabelecia em como a criança atribuía significado aos elementos de seu meio. Chomsky e seus seguidores chamaram essa ideia de gramática humana universal inerente, e Halliday desenvolveu a teoria da linguagem baseada em um sistema de escolhas, e seus resultados foram os modelos para a gramática funcional sistêmica e a linguística funcional sistêmica.
Atualmente, a abordagem de Halliday tem uma forte influência no campo da linguística descritiva (ela considera a língua como um sistema semiótico, é descritiva e interpretativa e é um recurso para produzirmos significados focados em três características: ideacional, que se relaciona com a construção de experiências e sua articulação; interpessoal, pois estabelece relações entre pessoas; e textual, pois se constitui nas unidades semânticas e coerentes dele), diferente da linguística descritiva de Bloomfield (1887-1949), que tem os objetivos de apontar as expressões usadas pelos falantes, analisar quando e por quem são produzidas; descrever seu funcionamento; identificar as formas de expressão existentes e verificar por quem são produzidas. A linguística de Halliday também é usada no treinamento de currículos de professores em todo o mundo. Ele teve a chance de mostrar suas teorias em sua resignação na Universidade de Londres e assumiu um posto na Colúmbia Britânica em Vancouver.
Um pouco mais da vida acadêmica e profissional de Halliday
Halliday havia se casado com três mulheres antes de se casar com Ruqaya Hasan, que foi uma de suas primeiras alunas e uma ótima linguista. Quando o governo canadense se recusou a garantir um visto para Halliday, Neil Hasan ofereceu-lhe a chance de estudar de perto como a criança desenvolve a gramática. Seu estudo mostrou que a criança constrói a gramática em etapas, por meio de interações específicas de sua vida. Com isso, ele publicou seu trabalho seminal, Learning how to Mean (Aprendendo a significar), em 1975, no qual Nigel ganhou o não convincente pseudônimo de Nigel. Há um senso de humor nessa obra, pois Halliday considerou dedicá-la ao governo canadense.
Seu trabalho inovador foi reconhecido pela Universidade de Sydney, que o nomeou professor fundador de linguística em 1976. Nas décadas seguintes, seu lar em Killara (subúrbio australiano de Sydney) e, depois, Manly, tornaram-se um ponto de encontro internacional para estudos da linguagem com Halliday e Hasan, nomeada professora de linguística na Universidade Macquarie, com grande demanda para conferências internacionais, visitas de professores e publicações.
Halliday se aposentou em 1987 e teve a chance de se ocupar com diversos passatempos, como caminhadas na mata, viagens de trem e palavras-cruzadas enigmáticas do Herald. Halliday e sua mulher dividiam seu tempo entre caminhadas em Manly e Urunga, na costa norte australiana, onde listavam as aves nativas do distrito.
Muitos artigos de conferência e livros culminaram na publicação de 11 volumes de obras coletadas de Halliday. Ele voltou à China e se reconciliou lá, onde suas teorias encontraram terreno fértil e são regularmente discutidas nas maiores universidades de Guangzhou, Pequim e Xangai.
Halliday e Hasan compareceram à abertura de um Centro para Estudos da Linguagem baseado em sua obra na Cidade Universitária de Hong Kong em 2006. Garçons de um restaurante em Manly se espantavam ao ver um ancião ocidental pedindo pratos fora do cardápio em mandarim fluente.
Os óculos espessos de Halliday e suas longas costeletas lhe davam uma aparência de coruja. Halliday era um homem acessível, e, apesar de seu status acadêmico considerado olímpico, ele permaneceu otimista sobre o futuro, mas seus pontos de vista eram temperados pelo pragmatismo de Yorkshire.
A morte de sua esposa em 2015 privou Halliday de sua amante e colaboradora.
Halliday morreu de causas naturais em Sydney, no dia 15 de abril de 2018, aos 93 anos.